quarta-feira, 17 de outubro de 2012

Roçando a perfeição

Sou tradutora, mas não sou crítica literária. Sou tradutora, mas antes de o ser, fui leitora; ou sendo tradutora, sou também leitora.

Assim, começarei de vez em quando a colocar aqui na minha Coluna de Fumo, as minhas opiniões a respeito do que vou lendo. Será apenas a minha opinião e vale o que vale, e não pretendo utilizar raciocínios demasiado elaborados, nem palavras demasiado rebuscadas. Não tenho preparação para isso, mas mesmo que o tivesse não o faria. Quando leio um livro, não o estou a racionalizar. Estou, simplesmente, a lê-lo com maior ou menor prazer. E também não me parece que quem leia as minhas opiniões, esteja interessado nisso. Na verdade, quem estará até interessado nas minhas opiniões?

Começo assim estas minhas opiniões, com o fabuloso "O Sino da Islândia" de Halldór Laxness (Prémio Nobel da Literatura 1955), publicado em Setembro de 2012, pela Cavalo de Ferro. Não preciso de contar a história do livro, para isso basta consultar o site da Editora em http://www.cavalodeferro.com. Mas posso falar-vos do que é ler um livro destes. 

Pegar n' O Sino da Islândia, é tocar em neve, em musgo húmido. É ver um povo pobre e oprimido, num outro século, numa outra vida. É ouvir as suas vozes, os seus gritos. É cheirar as suas manhãs, o seu mar. É saborear o seu peixe, a sua fome. Ler O Sino da Islândia é transcender o próprio sentido de "ler algo". O Sino da Islândia não se lê: inala-se. Há uma claridade que se instala, todo um outro mundo que se abre. Os pulmões ficam desobstruídos, os olhos mais límpidos, a garganta mais desanuviada. O Sino da Islândia não deve ser lido, deve ser respirado.

E quando se chega ao fim e se vêem passar os "cavalos negros, molhados de orvalho", sabemos que passámos por um momento único na vida. Voltamos a guardá-lo na estante, não o vamos trocar ou emprestar, porque haverá um dia em que quereremos lá voltar. Ou, citando uma das personagens do livro, "Neste pobre país onde tudo morre, dias destes reflectem a verdadeira natureza da vida eterna". E eu vou um pouco mais longe, "Neste pobre mundo onde tudo se corrompe, livros destes roçam a perfeição".

Deixo também uma chamada de atenção, para a extraordinária tradução de João Reis. Sem ela, esta obra de arte não teria tamanha intensidade. Obrigada, João.

 

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